Blog de Farley Rocha

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Qu4rteto (volume II)

* * *

Ensaios sobre a loucura

Desde muito tempo me intrigo com a arte principalmente pelo motivo de que, em qualquer gênero que seja, ela possui aquela linhazinha tênue da loucura, separando o real e o universo fictício. Uma linha percebida e determinada pelo próprio artista. Sinto que na poesia algo semelhante acontece: o poeta forje este limite enquanto escreve, e neste ato pouco se sabe o que do poeta é realidade e o que já se tornou loucura. Algumas vezes o poema acaba pisando do outro lado desta linha, e quando isso ocorre, não sabemos se são os versos que não fazem mais sentido ou se foi o poeta mesmo quem enlouqueceu...

Entre esse limite está o Qu4rteto...

*

1.

Anda. Esquizofrênicos passos

passam rente aos espaços.

Olha. Para e se cala

prestando atenção a nada.

Vê. Fala e sorri

observando tudo daqui.

Pensa: eu ou você

que anda olhando o que não pode ser?

*

2.

Antes de pensar algo,

deixe que eu não me explique,

deixe que eu não disfarce nada,

deixe que minha cara faça

a feição que tiver de ter.

*

Antes de desviar os olhos,

deixe que eu aconteça em mim,

deixe que eu demonstre tudo,

deixe que minha farsa faça

a ficção que tiver de ser.

*

3.

Árvore,

uma sombra refletida

pelo sol da manhã

ao acordar.

*

A alquimia do ar

pairando no respirar

de alguém que retorna

sem ter saído do lugar.

*

4.

Eu não tenho compromissos

com a realidade.

* * *
*
(Imagem em Art Fractal do designer e DJ Célio Ricardo Canibal)

Um comentário:

N. Rodrigues disse...

"Esquizofrênicos passos
passam rente aos espaços."

Tá aí algo que eu gostaria de ter escrito...

Simples, belo e sonoro -- como todo bom poema.

:)