Juarez de Oliveira* é um poeta da cidade e pelos seus escritos parece ter construído boa parte de sua abstração de mundo, pela película literária, em suas experiências de infância quando por aqui. Hoje é radicado em São Paulo. Viveu uma Espera Feliz com as ruas ainda sem calçamento e sem postes elétricos. Viu o trem passar e presenciou o processo de um vilarejo gradual de há meio século atrás, que crescia assim como as colinas que nos cercam.
Muitas de suas obras permeiam a atmosfera serrana e interiorana deste lugar, de um tempo desconhecido para muitos de nós, pós-modernos. “Visão das águas”, por exemplo, é um de seus livros que condensa bem esse mundo cuja essência se isolou intacta no limiar do passado. O poema que segue abaixo, da coletânea citada, remonta um pouco das particularidades desse mundo, aludindo a rua Capitão José Carlos de Souza, apelidada bem antes mesmo de eu nascer como “Rua Nova”.
Assim, imaginar Espera Feliz numa outra época é o mesmo que olhar a cidade por um caleidoscópio mágico, buscando lá longe no tempo imagens que não existem mais.
MENINOS DA RUA NOVA
(Juarez de Oliveira)
Os meninos da Rua Nova
jamais irão a Londres.
Dormem muito cedo,
acordam cedo de mais
antes do grande sonho
antes da mesa farta
antes que descerre
a última cortina de seda
bem antes do último whisky.
Os meninos da Rua Nova
ignoram os truques da vida.
Não se preocupe com eles!
Os meninos da Rua Nova
jamais baterão à sua porta,
são dóceis os meus meninos,
são todos simples demais,
prezam muito a humildade
talvez se lembrem do céu!
Os meninos da Rua Nova
são todos muito educados.
Suas roupas rotas,
seus pés sempre descalços
e suas bocas desnutridas
não escondem nenhum bandido,
nenhuma outra bandeira
talvez o medo da morte!
Maria morreu de fome.
Aqui a dor não impede
os meninos da Rua Nova
de correrem atrás do sonho
com a bola de meias velhas
no quintal de chão batido.
Os meninos da Rua Nova
despertarão mais felizes
quando o sino do natal
correr a nossa cidade.
Neste dia, como sempre,
porão a roupa de festa,
calçarão os pés descalços,
pedirão bênçãos ao padre,
irão à primeira missa,
ninguém dirá de tristeza!
Os meninos da Rua Nova
serão todos convidados
para uma festa qualquer.
E eles lá estarão,
por entre os muitos salgados,
servidos de tantos doces
a cabeça posta em sonho
sonhando o presente régio
quem sabe a bola de gás!
Os meninos da Rua Nova
jamais irão a Londres.
Nem fale isso aos meninos
ou dormirão assustados,
temendo a ave de aço,
ou a mula-sem-cabeça,
ou mesmo o bicho-papão.
Os meninos da Rua Nova
Sonham a chegada do Circo.
“E o palhaço o que é?
É ladrão de mulher!
E o palhaço o que é?
É ladrão de mulher!
Hoje tem marmelada?
Tem sim senhor!
Hoje tem goiabada?”...
* Em breve estarei postando um pequeno artigo sobre este poeta esperafelicense, a quem a cidade talvez deva a honra de tê-lo como o primeiro porta-voz da literatura das montanhas do leste.
Um comentário:
Olá Farley...
Primeiro, parabéns pelo artigo, achei-o em muito boa hora. Começaremos esta semana um projeto na rede municipal sobre este nosso ilustre conterrâneo e percebo que você teve acesso a informações as quais eu infelizmente ainda não tive. Se possível for gostaria de contar com a sua ajuda, no envio de informações ou fontes de informações. Meu nome é Kenia e meu e-mail é kapfu@yahoo.com.br, desde já obrigada e parabéns pelo blog.
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