Blog de Farley Rocha

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Fora o Faraó


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Certamente, graças à globalização, a mesma a qual eu e você e todo o resto não estamos imunes, os levantes sociais iniciados pela Tunísia já tomam proporções quase que em escala continental. Chegaram como um sopro aos desertos árabes e estão levando gente às ruas tanto quanto os grãos de areia das dunas que se movem por lá.

Tal motim, que anda derrubando regimes e ditadores de terras antigas, chega ao Egito e, ao que tudo indica, está abalando fortemente os blocos de rocha empilhados sobre suas pirâmides.

E estas pirâmides, do alto de sua antiguidade terrena (ou eram os deuses astronautas?), talvez nunca tenham presenciado tal gênero de manifestação. Pelo histórico de milhares de páginas daquele país, desde as eras bíblicas até a modernidade online, sabe-se que Cleópatras e Júlios Cézares, assim como os macedônios, os romanos e os ingleses, também as dinastias e ainda o que até hoje a arqueologia descobre, tudo isso vem sacudindo a rotina de um dos povos mais primordiais do mundo. Porém, um manifesto como este que ocorre por lá, da forma que está sucedendo, parece algo inédito e revolucionário.

Um solo que já assistiu a embates de conquistadores e resistências sobre sua aridez ocre e cobiçada, agora é palco para rebeliões completamente improváveis em si tratando de Egito. Egípcios civis, acostumados há cinco mil anos a andarem sobre passos vigiados pelo imperialismo, explodem coletivamente em uma atitude reprimida desde o velho testamento e expõem suas revoltas contra o idolatrado Faraó. E estão tão seguros disso assim como sabem que o Nilo irriga sua sede.

Nesse ritmo, talvez a civilização humana poderia assistir em tempo real a um segundo incêndio à Biblioteca de Alexandria, tamanha a subversão que a sociedade de Cairo e de outras cidades propõe na prática ao lançar coquetéis molotov pelos ares sem nuvem que as cobrem. As múmias que sobraram depois dos séculos empoeirando nos sarcófagos, talvez enfim tenham compreendido de fato o motivo de estar há tanto tempo conservadas no plano material. Assistiram ao início da submissão e obediência de seu povo; agora veem seu povo destituírem tal imposição, em prol do bom senso de todos e da liberdade que cabe a cada indivíduo que reivindica novos rumos para seus dias.

Eles, os egípcios, um dia quiseram voar como seus deuses. Falharam. Mas vale como metáfora para o que hoje acontece por lá: voam na intensidade de sua vontade, que é tão velha quanto a Esfinge ou as câmaras secretas dos antigos faraós – pondo fim ao que parece ser a última dinastia do deserto.

Fora o Faraó e todas as formas de poder absoluto! – devem estar bradando neste momento.

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